O serviço de Acolhimento Familiar é uma medida protetiva, temporária e excepcional,prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que visa acolher crianças e adolescentes em situação de risco social (negligência, abandono, abusos), em uma Família Acolhedora, previamente cadastrada, selecionada e vinculada a um programa. No Acolhimento Familiar o princípio básico refere-se à guarda da criança/adolescente, até que sua situação seja definida: retornar a família de origem, encaminhar para a família extensa ou habilitar para a adoção. Não havendo interessados em sua adoção, o Acolhimento Familiar pode se estender até o prazo previsto por lei (em alguns programas vai até os 18 anos e em outros até os 21 anos).
Obs: Uma vez inserida no programa como Família Acolhedora, esta não pode se candidatar para a adoção.
Há tempos este modelo é utilizado em países como Inglaterra, França, Espanha, Estados Unidos, Canadá, entre outros, baseados na premissa de que toda criança tem direito à convivência familiar e comunitária, além de ter assegurado o respeito à sua individualidade.
Diversos estudos comprovam que a falta de vínculos estáveis e a insuficiência de estímulos adequados trazem prejuízos, algumas vezes irreversíveis, ao desenvolvimento das crianças, seja no campo psicológico, psicomotor, cognitivo e de linguagem. No Brasil, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), menos de 5% das crianças e adolescentes acolhidos estão aos cuidados de Famílias Acolhedoras. ORFÃOS DA ROMENIA, TEORIA DO APEGO.
No modelo mais utilizado atualmente no Brasil, o Acolhimento Institucional (abrigos e casas lares), a despeito de haver profissionais competentes e estruturas para suprir as necessidades básicas, não há vínculos afetivos estáveis e duradouros capazes de prover o acolhido com referenciais que assegurem seu pleno desenvolvimento físico, social e emocional, devido às condições inerentes ao modelo. Outro ponto a se observar no modelo de acolhimento institucional é que não há condições de se manter plenamente o respeito às características e necessidades individuais de cada acolhido, o que gera problemas ligados ao autoconceito positivo, à sua saúde emocional e ao seu desenvolvimento integral. Além do que, o modelo institucional priva a criança e o adolescente do convívio social e comunitário, comprometendo sua futura adaptação em sociedade.
O Acolhimento Familiar visa o melhor interesse da criança/adolescente e o cumprimento da legislação em vigor.
Utilizado na Inglaterra, França, Espanha, Estados Unidos, Canadá
Presente no Estatuoda Criança e do Adolecente
No Acolhimento Institucionalatual não há vínculosafetivos estáveis e duradouros
Acolhimento Familiar visa o melhor interesse da criança/adolescente
Por lei, é preferencial ao acolhimento institucional
Teoria do Apego
Das teorias que discutem a importância do estabelecimento de vínculos afetivos entre a criança e figuras parentais, destaca-se a Teoria do Apego, desenvolvida por Bowlby (1969/1990, 1952/1995, 1979/1997) e Ainsworth, Blehar, Waters e Wall (1978).
Segundo ela, o ser humano é portador de uma história filogenética que lhe garante um aparato biológico, que o auxilia no estabelecimento e manutenção de vínculos afetivos com o outro, principalmente com a mãe (biológica ou substituta), sendo a constância dessa primeira vinculação afetiva crucial ao seu desenvolvimento psicossocial saudável.
Nessa teoria, verificam-se concepções sobre a importância da constância de uma pessoa (geralmente associada à figura materna) no cuidado dispensado ao bebê e sobre a determinação de um período sensível para o desenvolvimento do apego, que seria dos seis primeiros meses de vida aos três anos de idade. Assim, os autores tratam da primazia da relação de apego mãe-criança, apontando para conseqüências disfuncionais sobre o desenvolvimento social, psicológico e emocional da criança, caso a relação não se estabeleça, seja interrompida ou se mantenha de modo inadequado (Rossetti-Ferreira, 1986, 2006).


Orfãos da Romenia
Além de traumas psicológicos, o abandono nos primeiros anos de vida pode causar danos graves no desenvolvimento neurológico das crianças. Um estudo feito pelo Hospital de Crianças de Boston, da Universidade de Harvard, vem mapeando desde os anos 2000 os efeitos da institucionalização precoce no desenvolvimento do cérebro de crianças.
Os resultados são devastadores.
A pesquisa conhecida como “Orfãos da Romênia” revelou que crianças abrigadas por tempo prolongado, especialmente durante os primeiros anos de vida, têm déficits cognitivos significativos (incluindo diminuição de QI), aumento do risco de distúrbios psicológicos, redução da capacidade linguística, dificuldade de criação de vínculos afetivos, crescimento físico atrofiado, entre inúmeros outros sérios problemas, alguns deles irreversíveis. Por outro lado, uma análise comparativa, com base em mapeamento da atividade cerebral (EEG) mostrou que a intervenção precoce e eficaz pode ter um impacto positivo nos resultados a longo prazo.
No estudo, constataram que existe uma janela de tempo, denominada período crítico, que afetam campos cognitivos e emocionais. Já sabíamos das carências e consequências emocionais. Agora temos provas e urgências ligadas aos processos neurológicos: cada ano que uma criança vive num abrigo institucional aguardando a reintegração à família de origem ou a decisão sobre sua adoção, resulta em quatro meses de déficit em sua cognição geral.
ABANDONO CAUSA DANOS CEREBRAIS EM CRIANÇAS
Um estudo de alto nível de precisão e rigor científico, feito pelo Hospital de Crianças de Boston, da Universidade de Harvard, vem mapeando desde os anos 2000 os efeitos da institucionalização precoce no desenvolvimento do cérebro de crianças. Os resultados são devastadores.
A pesquisa conhecida como “Orfãos da Romênia” revelou que crianças abrigadas por tempo prolongado, especialmente durante os primeiros anos de vida, têm déficits cognitivos significativos (incluindo diminuição de QI), aumento do risco de distúrbios psicológicos, redução da capacidade linguística, dificuldade de criação de vínculos afetivos, crescimento físico atrofiado, entre inúmeros outros sérios problemas, alguns deles irreversíveis. Por outro lado, uma análise comparativa, com base em mapeamento da atividade cerebral (EEG) mostrou que a intervenção precoce e eficaz pode ter um impacto positivo nos resultados a longo prazo.
No estudo, constataram que existe uma janela de tempo, denominada período crítico, que afetam campos cognitivos e emocionais. Já sabíamos das carências e consequências emocionais. Agora temos provas e urgências ligadas aos processos neurológicos: cada ano que uma criança vive num abrigo institucional aguardando a reintegração à família de origem ou a decisão sobre sua adoção, resulta em quatro meses de déficit em sua cognição geral.
Como o estudo foi feito
Os pesquisadores americanos selecionaram 136 crianças entre 6 meses e 2,5 anos,abandonadas em instituições governamentais nos primeiros anos de vida, todas sem problemas neurológicos ou genéticos. Metade dessas crianças, escolhidas aleatoriamente, foi transferida para um acolhimento de alta performance criado especialmente para este estudo e a outra parte permaneceu nas instituições precárias e super lotadas. Também foi selecionado um grupo comparativo de 72 crianças que nunca haviam sido institucionalizadas e viviam com suas famílias de origem.
No início da pesquisa, no outono de 2000, a Romênia vivia os reflexos do duro regime comunista de NicolaeCeausescu. Para aumentar a natalidade e a mão de obra no país, o ditador proibiu o aborto, o uso de contraceptivos e cobrava altos impostos das famílias que não tivessem filhos ou dos que tivessem poucos. O resultado foi a explosão da taxa de natalidade, que aliado à miséria do país, levou milhares de bebês e crianças aos orfanatos estatais. Ao final do regime de Ceausescu, em 1989, quando foi executado pelo Exército, havia mais de 170 mil órfãos vivendo em 700 instituições superlotadas e precárias. Cresciam isoladas do resto da sociedade, eram frequentemente vítimas de castigos físicos e de abusos sexuais e algumas sofriam de desnutrição.
Como dado comparativo, a população do Brasil é atualmente dez vezes maior do que na Romênia, e o número de crianças acolhidas no Brasil está próximo de 46 mil (dados de janeiro de 2017), número infinitamente menor do que na Romênia dos anos 2000, mas ainda considerado altíssimo pelos organismos internacionais. Estimam-se segundo dados da Unicef, que existam mais de 8 milhões de crianças e jovens acolhidos em todo o mundo.
Essa trágica situação da Romênia ganhou destaque internacional e levou à pesquisa chamada oficialmente de “Programa de Intervenção Precoce de Bucareste”, coordenada pelos professores e pesquisadores Charles A. Nelson III, da Escola de Medicina de Harvard e do Hospital de Crianças de Boston; Nathan A. Fox, da Universidade de Maryland; e Charles H. Zeanah, da Universidade de Tulane, em cooperação com o novo governo romeno.
Os resultados dos estudos, medidos inicialmente até os 12 anos de idade, sugerem que a institucionalização precoce leva a déficits profundos em muitos domínios, incluindo comportamentos cognitivos (o QI) e sócio emocionais (apego), atividade e estrutura cerebral e uma incidência muito elevada de transtornos psiquiátricos e deficiências. Elas vêm sendo avaliadas periodicamente e, em uma segunda fase, serão reexaminadas aos 16 anos, para determinar se a intervenção tem efeitos mais duradouros e se existem outros períodos sensíveis para a recuperação e quais são os mecanismos associados a essa mudança.
A importância do afeto
Segundo os autores da pesquisa, o cuidado infantil vai muito além de apenastrocar fraldas ou alimentar as crianças. O desenvolvimento cerebral de bebês e crianças pequenas depende do estímulo dos pais ou cuidadores, ou seja, de interação social e afetiva. É através dos estímulos gerados pelo afeto, que a criança amplia seu entendimento de mundo e estabelece padrões de pensamento, raciocínio lógico e linguagem que vão ser presentes em todas as fases de sua vida.
A pesquisa comprova cientificamente o que já nos anos cinqüenta e sessenta John Bowlby afirmava em sua Teoria do Apego. O psiquiatra britânico procurou explicar em seus estudos como ocorre, e quais as implicações para a vida adulta, dos fortes vínculos afetivos entre o bebê e o provedor de segurança e conforto.
Usando vários mecanismos de avaliação, ente eles exames de eletroencefalograma (EEG), que mapeiam a atividade cerebral, a linguagem e a cognição, os estudos descobriram que existem períodos sensíveis que regulam a recuperação. Ou seja, quanto mais cedo uma criança for colocada em cuidado especial, com uma família, melhor será sua recuperação. Embora os períodos sensíveis para a recuperação variam, os resultados do estudo sugerem que a colocação antes da idade de dois anos é fundamental.
“Aos 30, 40 e 52 meses, o QI médio do grupo institucionalizado apresentou pontuação entre 70 e 75, enquanto as crianças adotadas mostraram cerca de 10 pontos a mais. Não foi surpresa que o QI de cerca de 100 foi o padrão médio para o grupo que nunca ficou nas instituições”, afirma a pesquisa. Outro dado relevante foi quanto ao período crítico de desenvolvimento. “As crianças encaminhadas ao acolhimento familiar antes do fim do período crítico de dois anos se saíram muito melhor que os que permaneceram em uma instituição quando testadas mais tarde (aos 42 meses), em quociente de desenvolvimento (QD), medida de inteligência equivalente ao QI, e na atividade elétrica cerebral, conforme avaliação por eletroencefalograma (EEG).”*
Os pesquisadores concluíram também que a maioria das crianças institucionalizadas apresentavam comprometimento nos vínculos afetivos. “Apenas 18% das crianças institucionalizadas, 42 meses depois do acolhimento, conseguiram criar vínculos afetivos seguros, enquanto que as crianças que estavam em acolhimento familiar esse número chegou a 68%. Além do QI, os pesquisadores ainda observaram outras diferenças entre as crianças que viviam com famílias e as que viviam nas instituições, como atrasos no desenvolvimento da linguagem, problemas de relacionamento e até diagnóstico psiquiátrico (63% para os institucionalizados contra 20% dos que nunca foram institucionalizados). Os índices de depressão e ansiedade também foram o dobro nas crianças de instituições, e o volume cerebral bem menor do que nas que convivem em famílias.” *
Foram feitos inúmeros outros estudos, mas a conclusão é uma só. Como crianças e jovens institucionalizados, privados de afeto, vínculos e estímulos, têm seu desenvolvimento geral comprometido, muitas vezes de forma irreversível.
*dados publicados na revista Scientific American Brasil.
Saiba mais no site oficial do programa www.bucharestearlyinterventionproject.org.
Encaminhamento de crianças e adolescentes em situação de risco